Laura

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sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Romantismo de Casimiro

 

 

 

 

 


AMOR E MEDO (Casimiro de Abreu - As Primaveras - 1859)









 











Quando eu te vejo e me desvio cauto




Da luz de fogo que te cerca, ó bela,


Contigo dizes, suspirando amores:


"Meu Deus! que gelo, que frieza aquela!"

Como te enganas! meu amor, é chama


Que se alimenta no voraz segredo,


E se te fujo é que te adoro louco...


És bela — eu moço; tens amor, eu — medo...


Tenho medo de mim, de ti, de tudo,

Da luz, da sombra, do silêncio ou vozes.






Das folhas secas, do chorar das fontes,

Das horas longas a correr velozes. 






O véu da noite me atormenta em dores


A luz da aurora me enternece os seios,


E ao vento fresco do cair cias tardes,

Eu me estremece de cruéis receios. 






É que esse vento que na várzea — ao longe,


Do colmo o fumo caprichoso ondeia,


Soprando um dia tornaria incêndio


A chama viva que teu riso ateia! 


Ai! se abrasado crepitasse o cedro,


Cedendo ao raio que a tormenta envia:

Diz: — que seria da plantinha humilde,





Que à sombra dela tão feliz crescia? 






A labareda que se enrosca ao tronco


Torrara a planta qual queimara o galho


E a pobre nunca reviver pudera.


Chovesse embora paternal orvalho! 


Ai! se te visse no calor da sesta,


A mão tremente no calor das tuas,

Amarrotado o teu vestido branco,






Soltos cabelos nas espáduas nuas! ... 


Ai! se eu te visse, Madalena pura,


Sobre o veludo reclinada a meio,


Olhos cerrados na volúpia doce,

Os braços frouxos — palpitante o seio!... 






Ai! se eu te visse em languidez sublime,


Na face as rosas virginais do pejo,


Trêmula a fala, a protestar baixinho...

Vermelha a boca, soluçando um beijo!... 






Diz: — que seria da pureza de anjo,


Das vestes alvas, do candor das asa
Tu te queimaras, a pisar descalça,


Criança louca — sobre um chão de brasas!
No fogo vivo eu me abrasara inteiro!


Ébrio e sedento na fugaz vertigem,


Vil, machucara com meu dedo impuro
As pobres flores da grinalda virgem! 


Vampiro infame, eu sorveria em beijos


Toda a inocência que teu lábio encerra,


E tu serias no lascivo abraço,


Anjo enlodado nos pauis da terra. 


Depois... desperta no febril delírio,


— Olhos pisados — como um vão lamento,
Tu perguntaras: que é da minha coroa?...


Eu te diria: desfolhou-a o vento!..
Oh! não me chames coração de gelo!
em vês: traí-me no fatal segredo.


Se de ti fujo é que te adoro e muito!
És bela — eu moço; tens amor, eu — medo!...



















 



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